15 de março de 2025

DIA NACIONAL DA POESIA

Em 14 de março, foi celebrado o Dia Nacional da Poesia. A data escolhida é uma homenagem ao nascimento do poeta Castro Alves.

Para homenagear a todos os poetas da literatura brasileira, selecionei um dos mais belos poemas de Carlos Drummond de Andrade, que é a própria teoria da poesia.

Do livro, A Rosa do Povo:


PROCURA DA POESIA

Não faças versos sobre acontecimentos.
Não há criação nem morte perante a poesia.
Diante dela, a vida é um sol estático,
não aquece nem ilumina.
As afinidades, os aniversários, os incidentes pessoais não contam.
Não faças poesia com o corpo,
esse excelente, completo e confortável corpo, tão infenso à efusão lírica.

Tua gota de bile, tua careta de gozo ou dor no escuro
são indiferentes.
Não me reveles teus sentimentos,
que se prevalecem de equívoco e tentam a longa viagem.
O que pensas e sentes, isso ainda não é poesia.

Não cantes tua cidade, deixa-a em paz.
O canto não é o movimento das máquinas nem o segredo das casas.
Não é música ouvida de passagem, rumor do mar nas ruas junto à linha de espuma.

O canto não é a natureza
nem os homens em sociedade.
Para ele, chuva e noite, fadiga e esperança nada significam.
A poesia (não tires poesia das coisas)
elide sujeito e objeto.

Não dramatizes, não invoques,
não indagues. Não percas tempo em mentir.
Não te aborreças.
Teu iate de marfim, teu sapato de diamante,
vossas mazurcas e abusões, vossos esqueletos de família
desaparecem na curva do tempo, é algo imprestável.

Não recomponhas
tua sepultada e merencória infância.
Não osciles entre o espelho e a
memória em dissipação.
Que se dissipou, não era poesia.
Que se partiu, cristal não era.

Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata.
Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário.

Convive com teus poemas, antes de escrevê-los.
Tem paciência, se obscuros. Calma, se te provocam.
Espera que cada um se realize e consume
com seu poder de palavra
e seu poder de silêncio.
Não forces o poema a desprender-se do limbo.
Não colhas no chão o poema que se perdeu.
Não adules o poema. Aceita-o
como ele aceitará sua forma definitiva e concentrada
no espaço.

Chega mais perto e contempla as palavras.
Cada uma
tem mil faces secretas sob a face neutra
e te pergunta, sem interesse pela resposta,
pobre ou terrível que lhe deres:
Trouxeste a chave?

Repara:
ermas de melodia e conceito
elas se refugiaram na noite, as palavras.
Ainda úmidas e impregnadas de sono,
rolam num rio difícil e se transformam em desprezo.

Carlos Drummond de Andrade






12 de janeiro de 2025

LIVROS COM O TEMA: FUTEBOL

Recebi, recentemente, no Canal, um pedido de um jogador de futebol profissional, o Dudu, do Cruzeiro: dica de livros com o tema futebol. Pedido feito, é pedido atendido!

Selecionei da literatura infantojuvenil, dicas bacanas de livros, para todas as idades.

1. Uma História de Futebol, de José Roberto Torero

Dois amigos, o Zuza e o Dico, que são fanáticos por futebol, provam que uma amizade pode mudar uma vida e como um menino do interior pode se tornar um grande jogador de futebol, mundialmente conhecido. Uma história surpreendente!



2. A menina que amava futebol, de Ilan Brenman

A menina Ana é apaixonada por futebol, mas seus amigos (meninos) não a deixam jogar no time de jeito nenhum. Um dia, ela acaba substituindo um jogador do time e... ah, só lendo o final dessa incrível história!


3. Bola no pé: a incrível história do futebol, de Ivan Zigg

Um texto leve, informativo e divertido que narra os momentos mais importantes do futebol e os diferentes termos, que nós leigos desconhecemos, além de mostrar a importância deste esporte.


4. Quando é dia de futebol, de Carlos Drummond de Andrade.

Em verso e prosa, relata 9 Copas, o auge do jogador Pelé e o efeito do futebol em uma nação.




5. A Turma da Mônica em O Campeonato, Criação de Mauricio de Sousa, da Ciranda Cultural.

As aventuras da turminha em mais uma história divertida, para todas as idades.



Mais dicas:

Além desses livros, recomendo a biografia, premiada com o Jabuti de 1996: Estrela Solitária, de Ruy Castro, baseada na vida de Garrincha.

A Coleção "Feras do Futebol", da Fundamento Editorial

Você, leitor, tem algum pedido de dicas de livros? Comente aqui ou envie um e-mail para sandracoimbra.leituras@gmail.com

Até as próximas dicas!

                                                          


FELIZ ANO NOVO!

Bem-vindo, 2025!

Neste ano, que se inicia, quero reforçar o meu amor pela leitura literária e o meu  compromisso com todos os leitores deste blog para ser um novo ano realmente renovado.

Ano passado, as atualizações foram poucas por aqui, mas quero me redimir neste 2025. Este espaço é o meu xodó (aqui tudo começou) e o Leituras & Literatura se expandiu para outros voos. Hoje, além do blog, há a página da rede social (Instagram) e a do Canal do YouTube.

Continuo por aqui e por onde a leitura e a literatura me levarem. E com a inspiração de "Esperança", dos versos do poeta Mario Quintana, seguimos em frente. 

Avante, leitores! 📕


Esperança 

Lá bem no alto do décimo segundo andar do Ano
Vive uma louca chamada Esperança
E ela pensa que quando todas as sirenas
Todas as buzinas
Todos os reco-recos tocarem
Atira-se
E
— ó delicioso voo!
Ela será encontrada miraculosamente incólume na calçada,
Outra vez criança…
E em torno dela indagará o povo:
— Como é teu nome, meninazinha de olhos verdes?
E ela lhes dirá
(É preciso dizer-lhes tudo de novo!)
Ela lhes dirá bem devagarinho, para que não esqueçam:
— O meu nome é ES-PE-RAN-ÇA…

(Mario Quintana)




31 de julho de 2024

"Faz poesia como faz bom tempo"

"Lírica, bíblica, existencial, faz poesia como faz bom tempo" - essas foram as palavras de Carlos Drummond de Andrade ao se referir à poesia da mineira Adélia Prado. O poeta foi fundamental no início da carreira literária de Adélia. Ele também a ajudou indicando o seu livro "Bagagem" a um editor que veio a publicá-lo.

Em junho, deste ano, a autora, aos 88 anos de idade, foi agraciada com dois prêmios: Machado de Assis, da ABL, Academia Brasileira de Letras e Camões, o mais importante da língua portuguesa. 

Com Licença Poética

Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta, anunciou:
vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado pra mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não tão feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas, o que sinto escrevo. Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
— dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida, é maldição pra homem.

Mulher é desdobrável. Eu sou.

🌸

Momento

Enquanto eu fiquei alegre,
permaneceram um bule azul com um descascado no bico,
uma garrafa de pimenta pelo meio,
um latido e um céu limpidíssimo
com recém-feitas estrelas.
Resistiram nos seu lugares, em seus ofícios,
constituindo o mundo pra mim, anteparo
para o que foi um acometimento:
súbito é bom ter um corpo pra rir
e sacudir a cabeça. A vida é mais tempo
alegre do que triste. Melhor é ser.

🌸

Janela

Janela, palavra linda.
Janela é o bater das asas da borboleta amarela.
Abre pra fora as duas folhas de madeira à-toa pintada,
janela jeca, de azul.
Eu pulo você pra dentro e pra fora, monto a cavalo em você,
meu pé esbarra no chão. Janela sobre o mundo aberta, por onde vi
o casamento da Anita esperando neném, a mãe
do Pedro Cisterna urinando na chuva, por onde vi
meu bem chegar de bicicleta e dizer a meu pai:
minhas intenções com sua filha são as melhores possíveis.
Ô janela com tramela, brincadeira de ladrão,
claraboia na minha alma,
olho no meu coração.